Adriano Machado/Crusoé

Tasso vai para a guerra

O senador tucano assume a candidatura à presidência do Senado, na qual enfrentará o notório Renan Calheiros, e anuncia a sua principal bandeira: a aprovação das reformas para impulsionar o crescimento econômico
14.12.18

Tasso Jereissati está pronto para enfrentar Renan Calheiros na disputa pela presidência do Senado. Governador do Ceará por três vezes, presidente do PSDB por duas e em seu segundo mandato como senador, o cearense, que completa 70 anos neste sábado, partirá para aquela que talvez seja a última disputa política de sua carreira. “Meu nome está colocado”, diz, em entrevista a Crusoé em seu gabinete, decorado com esculturas de figuras tradicionais nordestinas, como Padre Cícero, Patativa do Assaré e Luiz Gonzaga. A despeito das décadas dedicadas à política, o tucano pretende se apresentar como o nome da mudança na corrida pela cadeira que hoje pertence ao também cearense Eunício de Oliveira, do mesmo MDB de Renan. “Essa troca de poder entre os mesmos já vem há mais de 20, 30 anos aqui. É sempre o mesmo grupo e o mesmo subgrupo. Então a ideia é a de que é a hora de fazer uma mudança, mesmo porque as urnas disseram que é a hora de mudança”.

O senador pretende, ainda, encampar a agenda de reformas na economia idealizadas pelo futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, da qual é entusiasta. Ele defende que o próximo presidente do Senado deve trabalhar em busca do diálogo, sem ser submisso ao governo, mas também sem se comportar como “oposição raivosa”. Formado em administração de empresas pela Fundação Getúlio Vargas, ele é dono de um patrimônio declarado de 389 milhões de reais, que inclui três shopping centers (em Belém, Campo Grande e Fortaleza), uma engarrafadora de bebidas presente em doze estados, duas emissoras de televisão e oito rádios. Um dia antes da entrevista, Tasso viu o colega de partido Aécio Neves ser alvo de mais uma operação da Polícia Federal. Chegou a defender sua expulsão do PSDB. “Eu acho que o Aécio já prejudicou muito o partido”, afirmou, horas após a notícia. A Crusoé, ele reiteirou que as suspeitas contra o correligionário, se comprovadas, são “graves”. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Afinal, o sr. é candidato a presidente do Senado?
Meu nome está colocado, sim. Sou pré-candidato. É o seguinte: eu nunca pensei em ser candidato, até porque a praxe é que o maior partido eleja o presidente. E nosso partido (PSDB) nunca fez a maior bancada. Então isso nunca me passou pela cabeça.

O que o fez mudar de ideia?
Houve uma mudança muito grande no Senado. Antigamente havia um partido com a maior bancada, com muito mais senadores do que os outros. Depois dele, havia dois ou três, no máximo, que juntos eram grandes e faziam a diferença. Isso mudou. O maior partido na próxima legislatura continua sendo o MDB, mas a diferença para os outros não é tão grande. Está quase em pé de igualdade com mais uns sete partidos, como PSDB, PSD, PP e PDT. Isso fez surgir essa ideia, diante da candidatura novamente do Renan.

Qual é o plano?
De fazer uma mudança. Porque essa troca de poder entre os mesmos já vem há mais de vinte, trinta anos aqui. É sempre o mesmo grupo e o mesmo subgrupo. Então a ideia é a de que é a hora de fazer uma mudança, mesmo porque as urnas disseram que é a hora de fazer diferente. E com a ideia também de que a presidência não é cadeira cativa de ninguém. Qualquer senador aqui pode ser presidente. Não existe diferença entre os senadores. Não existe uma cadeira guardada e cativa para alguém. Isso já foi mostrado dentro do MDB com o nome da Simone (refere-se a Simone Tebet, líder do MDB no Senado) e, a partir de determinado momento, com outro nome fora do MDB. Houve, então, uma sondagem comigo para saber se eu aceitaria e se eu entendia dessa maneira.

E o sr. aceitou prontamente?
Eu disse que sim, para fazer uma proposta nova diante do que está aí. De lá para cá aconteceram muitas coisas, apareceram outros possíveis nomes. Além de Simone, Esperidião (Amin) e Alvaro (Dias). Mas o meu nome está colocado. E acho que o ideal é que cheguemos a um consenso para que não haja disputa e que esse consenso seja em torno de um projeto.

O que é esse projeto exatamente?
O projeto exige equilíbrio, independência do Senado, independência da presidência, sem nenhum tipo de submissão ao governo, nenhum tipo de entrega e nenhum tipo de oposição raivosa. É a ideia de que o Senado seja um poder moderador diante da radicalização do país e diminua, mantendo a independência, o confronto com o Judiciário e o Executivo. É preciso que se abra uma perspectiva de diálogo para o país.

Por que Renan não se enquadra nesse projeto?
Nada pessoal contra o Renan. Apenas que o mesmo grupo está no Senado há cerca de 30 anos, com raros hiatos, e vai (participar da disputa) com uma posição de confronto com o Judiciário, o que não é nada saudável. Não precisamos de confronto com o Judiciário nem com o Executivo. Precisamos de respeito e harmonia, com independência. E valorizar a instituição em cima dessa atuação. Precisamos de protagonismo na moderação.

Quando o sr. se lançará oficialmente?
No final de janeiro.

Por quê?
Porque tem muito senador novo e ainda não sabemos com clareza como será o comportamento e a visão desses senadores novos. A gente imagina que eles venham com expectativa de renovação porque são frutos dessa eleição que acabou e na qual o eleitor mandou esse recado.

O sr. já conversou com alguns deles?
Tenho conversado com alguns. Sinto muito clima de mudança. Na maioria. Mas tem muita gente que já vem de experiência parlamentar. Sinto também muita expectativa em relação ao novo governo, suas primeiras ações, iniciativas de reformas, postura em relação ao Congresso…

Renan já está em campanha.
Aparentemente, sim. Eu não estou em campanha no sentido tradicional. Não é muito meu estilo chegar e ficar constrangendo os colegas, (perguntando) se votarão em mim ou não. Tenho falado, na medida do possível, sobre o Senado e qual deve ser o seu papel daqui em diante.

O sr. é o candidato anti-Renan?
Não quero ser o anti-Renan. Não quero ser contra ninguém. Eu quero ter uma proposta positiva e é essa a mensagem que estou levando. Sobre a necessidade de o Senado ser um grande protagonista nas reformas, na conciliação e no diálogo não só entre as diversas correntes políticas, mas entre as instituições. O papel do Senado é dar segurança e tranquilidade, e não ser fonte de crises.

Adriano Machado/CrusoéAdriano Machado/CrusoéO senador tucano quer interromper o domínio do MDB no comando do Senado
Em tuíte recente, Renan o acusou de ter ligado para ele durante a eleição pedindo apoio em uma votação que beneficiaria suas empresas.
Eu acho que a imagem do político do Senado e dos senadores está muito ruim. Eu me recuso a entrar em bate-boca nesse nível. Só entro para discutir projetos e propostas. Isso só faz diminuir o Senado.

Chegou a procurá-lo depois desse episódio?
De jeito nenhum. Não tenho perdido muito tempo com essas coisas dele. Acho cada vez mais difícil aceitar que alguém na presidência do Senado possa assumir esse tipo de postura. Não é bom para o país nem para o Senado.

O sr. atua nas suas empresas?
Zero.

Zero?
Zero, não. Olho os números.

Nem frequenta as suas empresas?
Ou você delega pra valer, faz um sistema de governança, ou quebra. Porque não dá tempo nem há concentração para isso. Eu só acompanho os números mesmo.

O modelo que Jair Bolsonaro pretende implementar, de negociar com frentes parlamentares em vez de partidos, pode dar certo?
Acho que até agora está causando muita confusão. Vejo aqui (no Senado) uma confusão tremenda e acho que eles vão ter que mudar isso durante o caminho. Está confuso. Os (grupos) temáticos são de partidos diferentes e não se sentem dentro do diálogo. Por outro lado, os partidos não se sentem conectados com os temáticos e não tem uma coordenação só. Então está uma coisa absolutamente descoordenada.

Nesta semana o futuro ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, esteve com o sr. e a bancada do PSDB. Foi uma sinalização de que o futuro governo o apoia?
Entendi que tem boa vontade, mas ele deixou bem claro que estava fazendo uma visita de cortesia às bancadas e que quer diálogo com o nosso partido. Quer construir uma agenda com o partido. Enfim, não foi nenhuma sinalização específica em relação à presidência do Senado, até porque ele deixou claro que vê com bons olhos outros candidatos também.

O sr. teve dois aliados nomeados para o governo Bolsonaro, o general Guilherme Teophilo para a Secretaria Nacional de Segurança Pública, e Mayra Pinheiro para uma secretaria no Ministério da Saúde. Foram indicações suas?
É uma grande coincidência. Evidentemente, o general Teophilo não fui eu quem indicou. Ele me procurou e até se desfiliou do partido não porque pediram, mas porque ele não quis causar nenhum constrangimento ao PSDB. Foi muito elegante. É uma pessoa de reputação enorme. Um general de quatro estrelas que foi para a reserva neste ano. Naturalmente, com a presença desse núcleo de generais no governo, ele seria convidado para alguma coisa, independentemente de partidos. A Mayra também foi coincidência. Ela foi presidente do Sindicato dos Médicos do Ceará e se destacou na oposição ao programa Mais Médicos. E com a ascensão do ministro Mandetta (escolhido para a Saúde), que também participou ativamente desse movimento, foi quase natural.

Qual é a sua avaliação sobre o ministério de Bolsonaro?
Alguns ministros, eu não conheço. Na área econômica, me parece um time muito bom. Falta-lhes experiência política, de relacionamento, entender a dificuldade da vida pública, o relacionamento com o Congresso. Mas é uma equipe de primeira qualidade. Uma coisa que o Bolsonaro tem feito até agora é ser coerente com a sua campanha. Já se esperava isso dele, pelo que disse na campanha. A maioria dos presidentes eleitos no Brasil tem uma história de estelionato eleitoral, de falar uma coisa na campanha e fazer outra na Presidência. Disso Bolsonaro não pode ser acusado.

O grande número de militares no futuro governo o incomoda de alguma forma?
Para quem vem da época do período militar, isso sempre é uma coisa que a gente vê, assim, com certa preocupação. Mas essa nova geração de generais que está aí tem uma mentalidade completamente diferente da daquela época. Passaram e viram a experiência que já tiveram e eu acho que não querem repetir. E, até nos contatos que tive com o general Teophilo, vi que as novas gerações têm disciplina forte e rigorosa em relação à letra da Constituição. Isso é positivo.

Adriano Machado/CrusoéAdriano Machado/CrusoéO senador quer dar atenção especial às reformas: “urgência urgentíssima”
E quanto ao restante?
Tenho dúvidas sobre alguns ministérios e sobre alguns ministros.

Quais?
Tenho dúvidas sobre o ministro da Educação (Ricardo Vélez Rodríguez) e o das Relações Exteriores (Ernesto Araújo). Digo pelo que li por vocês, pelos jornais, pela imprensa, um ou outro ponto.

O Senado deve se colocar como trava a eventuais projetos polêmicos dessas pastas ou de outras, se for o caso?
Não diria trava. O Senado tem que ter papel moderador. Não ser nem trava automática nem destrava automática. Tem que levar cada assunto a bom termo, em cima do diálogo e do debate. Essa é uma grande função do Senado.

O que o sr. pensa sobre a proposta de redução da maioridade penal?
Tenho dúvidas porque tenho visto no meu estado, um dos que estão mais ocupados por estas facções, o recrutamento que elas fazem de menores de idade. É coisa absurda. Usam como escudo em função dos benefícios que eles têm por serem menores de idade. É um assunto para ser debatido.

Quais devem ser os assuntos prioritários do Congresso Nacional a partir de janeiro?
Temos uma urgência urgentíssima que são as reformas econômicas, principalmente a da Previdência. O Brasil tem uma possibilidade gigantesca de crescimento, mas a questão fiscal é premissa para que o país volte a desenvolver-se. E, evidentemente, vivemos um momento de caos na segurança. São duas agendas fundamentais e urgentes.

O Congresso vai aprovar o tripé do programa econômico de Paulo Guedes, baseado nas reformas da Previdência e do estado e nas privatizações?
Acho difícil sair do Congresso do mesmo jeito que chegar, mas há grande possibilidade de passar. Há uma assimilação muito grande dos deputados e senadores da importância desses temas. E quanto mais cedo fizer, melhor.

Bolsonaro fica enfraquecido com o episódio das movimentações financeiras suspeitas do ex-motorista do filho dele?
Claro. Na medida em que o discurso do presidente, o pilar central, é o da anticorrupção, uma acusação dessas evidentemente provoca uma rachadura no discurso. Agora, vamos aguardar e ver. É uma situação que precisa ser esclarecida com certa urgência.

Qual será o papel do PSDB no futuro governo?
A minha visão é bem clara. Primeiro, torcer para que dê certo e apoiar o novo governo em tudo aquilo em que acreditamos como partido. A visão econômica que está sendo pintada é muito parecida com a nossa. Mas, ao mesmo tempo, o PSDB precisa ter independência suficiente para minimizar alguns pontos mais radicais que estamos vendo em outras áreas.

O PSDB será parte da base aliada?
Não. Tivemos uma eleição e precisamos ser coerentes. A população não nos colocou no governo, então não somos base do governo. Mas também não trabalharemos nunca na linha do quanto pior melhor, de fazer oposição sistemática.

O que explica, em sua opinião, o desempenho pífio de seu partido nas últimas eleições presidenciais?
O partido cometeu muitos erros nos últimos anos. Todos os grandes partidos foram punidos, e nós fomos um deles.

Quais foram os principais erros?
Da última vez em que fui presidente do PSDB, propus um mea culpa. Chegamos a fazer um filme para a televisão mostrando os nossos erros. Defendi uma tremenda autocrítica dos nossos problemas e a explicação de onde erramos. Isso antes da eleição, um ano e meio antes. Ao mesmo tempo, propus que fizéssemos a refundação do PSDB em cima dessa autocrítica. O partido não quis. Acho que o grande erro foi não entender que naquele momento precisávamos fazer a autocrítica.

Foi por isso, então, que Alckmin perdeu?
Ele perdeu porque representávamos a política do passado e toda a carga que isso significa. E porque nos descaracterizamos dos nossos princípios fundadores.

Foi correta a estratégia de, na campanha, atacar mais Bolsonaro do que o PT?
Isso foi estratégia de campanha. Tenho minhas dúvidas se foi isso (que levou à derrota). A eleição já estava perdida.

O partido teve um número de votos muito menor, viu suas bancadas diminuírem e elegeu menos governadores. Como vai reagir?
Ou a gente se refunda, reavalia e checa nossos atos em relação aos nossos princípios, ou vamos sofrer muito.

O senador Aécio Neves foi alvo de mais uma operação da Polícia Federal nesta semana. O que fazer com ele?
Tudo o que sei é pelos jornais. O que achei é que, se esse negócio de mesada for comprovado, é muito grave.

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