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O banqueiro de Lula

Na parte ainda desconhecida de sua delação premiada, Antonio Palocci diz que o banqueiro André Esteves operava pagamentos para o ex-presidente. Os depoimentos podem multiplicar os apuros do chefe petista
05.10.18

Quando o juiz Sergio Moro levantou o sigilo de parte da delação de Antonio Palocci, na última segunda-feira, a grita veio rápido. O roteiro já manjado tenta, mais uma vez, emplacar a narrativa de que o ex-presidente Lula é vítima de perseguição. Palocci, ex-ministro dos governos do PT, falou — e falou muito — sobre a origem do maior esquema de corrupção do país. O contra-ataque foi imediato. Moro foi acusado de tentar prejudicar deliberadamente o partido nas eleições. Palocci, preso há dois anos, foi tachado de mentiroso. É mais um capítulo no cabo de guerra petista contra delatores e investigadores. Mas, por trás da fumaça, há mais explosões por vir.

A parte da colaboração de Palocci cujo sigilo foi levantado por Moro é reveladora da gênese da corrupção petista. O ex-companheiro Palocci, que fazia o meio de campo entre o partido e os grandes empresários do país, contou aos investigadores que, pelo menos desde 2007, Lula sabia dos crimes na Petrobras. Disse ainda que houve propina em 90% das medidas provisórias editadas pelos governos Lula e Dilma Rousseff. E que as duas campanhas de Dilma ao Palácio do Planalto custaram 1,4 bilhão de reais, mais do que o dobro dos valores declarados oficialmente à Justiça Eleitoral.

Se os trechos conhecidos da delação provocaram a ira dos petistas, os que ainda estão protegidos por sigilo têm potencial para provocar uma reação ainda mais virulenta. Em um deles, Palocci diz que Lula tinha um banqueiro para chamar de seu. Segundo o ex-ministro, André Esteves, controlador do banco BTG, atuou em operações cujo objetivo, ao fim e ao cabo, era abastecer os cofres do PT. Em uma das passagens do depoimento que prestou sobre o assunto, Palocci vai ainda mais além: afirma que Esteves participou, inclusive, de operações que beneficiaram pessoalmente o ex-presidente.

Adriano Machado/CrusoéAdriano Machado/CrusoéA delação de Palocci tende a gerar novas investigações sobre Lula
Na condição de delator, Palocci precisa fornecer provas ou ao menos dar aos investigadores os caminhos que permitam comprovar o que ele diz. Segundo fontes próximas da investigação, as frentes abertas a partir da colaboração do ex-ministro têm avançado – e avançado muito bem. Há equipes destacadas para trabalhar exclusivamente na coleta de elementos que possam ser somados aos relatos. A parte relativa à tríade Lula-PT-André Esteves é uma das que vêm sendo tratadas com prioridade. Nessa frente, os investigadores têm cruzado informações obtidas em outras etapas da Lava Jato que, de alguma forma, se relacionam com os fatos narrados pelo ex-ministro.

Não é a primeira vez que o nome de André Esteves, banqueiro cujos negócios chegaram ao zênite na era petista, aparece na operação. Em 2015, ele chegou a ser preso sob suspeita de tentar comprar o silêncio do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, processo em que foi absolvido em julho deste ano. Também foi acusado de pagar propina ao comprar ativos da estatal na África – em 2013, o BTG comprou metade da Petroafrica, o braço de operações da petrolífera brasileira no continente africano. O banqueiro é alvo, ainda hoje, de um processo que corre no Supremo Tribunal Federal, por ter destinado, segundo os delatores Cerveró e Alberto Youssef, 6 milhões de reais em propinas ao ex-presidente Fernando Collor.

A nova acusação, produto da delação de Palocci, deve impor novos embaraços não só ao dono do BTG como também a Lula, já investigado e processado em casos que correm em Curitiba e Brasília. O sucesso dessas novas investigações virou questão de honra para a Polícia Federal, que travou uma intensa queda de braço com o Ministério Público pelo direito de celebrar acordos de delação – direito que foi garantido aos policiais, recentemente, por uma decisão do Supremo Tribunal Federal. A delação do ex-petista virou um emblema dessa briga. Antes de acertar a colaboração com a polícia, Palocci havia procurado tanto a Procuradoria-Geral da República, em Brasília, quanto procuradores da Lava Jato e Curitiba. Com o MP, as conversas não avançaram.

Nelson Jr./SCO/STFNelson Jr./SCO/STFUma outra parte da delação está sobre a mesa do ministro Fachin
Uma vez firmado o acerto com a PF, os procuradores reagiram institucionalmente. Aproveitaram para atacar a capacidade dos policiais de negociar delações. As críticas foram muitas. Eles disseram, por exemplo, que a delação de Palocci era fraca e não continha novidades. Quem conhece a fundo as revelações feitas pelo ex-ministro, porém, garante que não é bem assim. Tanto que a delação firmada com os policiais em Curitiba tende a se multiplicar no curtíssimo prazo.

No acordo assinado na capital paranaense e já homologado pela Justiça, Palocci fala apenas de assuntos relativos a processos que correm no gabinete do juiz Sergio Moro. No termo, porém, o ex-petista se comprometeu a abastecer, com as informações que tem, outras investigações. Crusoé apurou que, como parte desse compromisso, ele celebrou recentemente um acordo com o grupo de delegados federais que atua nos casos da Lava Jato em curso no Supremo Tribunal Federal. Esse segundo acordo, em cujos anexos estão citados políticos detentores de foro privilegiado, já tem parecer parcialmente favorável da Procuradoria-Geral da República e, no momento, aguarda homologação por parte do ministro Edson Fachin.

Há, ainda, um terceiro acordo em vias de ser assinado por Antonio Palocci. Desta vez, com delegados e procuradores do Ministério Público Federal em Brasília que investigam, entre outras coisas, um megaesquema de venda de medidas provisórias montado durante os governos petistas. Na prática, tudo o que o ex-ministro se dispunha a dizer quando se ofereceu pela primeira vez para ser delator está abarcado nesses três acordos – o de Curitiba e os dois de Brasília. Ou seja: vem muito mais por aí.

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