Carlos Fernandodos santos lima

É a economia, estúpido!

26.11.21

Quando Bill Clinton tornou-se candidato democrata em 1992, contra o então presidente George H. W. Bush, o seu marqueteiro James Carville cunhou as três mensagens que embasariam toda a vitoriosa campanha: “não se esqueça da assistência médica”, “mudança x mais do mesmo”, e a que ficou famosa pela concisão “é a economia, estúpido!”.

Se a segunda delas, afirmando a necessidade de mudança, foi central na eleição de Barack Obama, em 2008, a ênfase da campanha de Clinton no enfrentamento da recessão do final do governo Bush foi o catalisador das esperanças dos americanos naquele início dos anos 90. Assim, a percepção de que nenhum discurso ideológico resiste a uma situação econômica ruim passou a ser a regra mais importante a ser observada por qualquer manual de campanha eleitoral moderno.

Dessa forma, é importante deixar claro que essa mensagem deve também orientar a campanha do candidato da terceira via nas próximas eleições presidenciais, seja ele qual for. Por mais que as absurdas discussões da direita cultural bolsonarista sejam convidativas para uma enérgica oposição, por mais que haja a tentação de enveredar por temas mais complexos e de difícil entendimento pela população – não que não sejam importantes, mas apenas distração do principal –, a questão mais importante e decisiva da próxima campanha é a recuperação econômica.

Isso acontece principalmente pela destruição promovida pelo governo Bolsonaro, incapaz de enfrentar corajosamente os efeitos destrutivos da pandemia e da inflação subsequente. A apropriação do orçamento público pela classe política – e aqui estou falando do Centrão, com suas soluções “milagrosas”, que, na verdade, significam o engessamento completo do orçamento e a quebra da segurança jurídica –, leva a uma descrença do mercado na solução dos problemas estruturais de nossa economia e na incapacidade de qualquer recuperação significativa tão logo as cadeias de produção mundiais se reestruturem novamente.

Como Bolsonaro não chegará em outubro de 2022 com algum sucesso econômico para mostrar ao eleitorado, o esquecimento dos equívocos da chamada Nova Matriz Econômica do governo Dilma parece estar incentivando os setores à esquerda do já esquerdista Partido dos Trabalhadores a repetir o receituário equivocado que nos levou à recessão e inflação no final de 2016. Infelizmente, há setores intelectuais que acreditam que, se repetirem infinitamente a receita de um fracasso, ele se tornará de modo mágico – normalmente designado como “vontade política” –, um sucesso.

Acreditar que é possível ter uma política econômica eficiente longe dos fundamentos econômicos e das expectativas do mercado é um dos erros mais frequentes da esquerda. Não é questão de acreditar ou não na existência desse ser mítico chamado de mercado, mas, independentemente de sua crença ou não, contrapor-se a ele é tão inteligente quando dar murro em ponta de faca – o que o Brasil já deveria estar cansado de fazer e a experiência argentina demonstra exaustivamente resultar em deterioração e agravamento ainda maior da pobreza e falta de perspectiva para a população. Usá-lo, aproveitar de suas idiossincrasias e humores é muito mais inteligente que se opor ideologicamente. Não importa a cor do gato, mas, sim, se ele caça os ratos.

Aliás, pragmaticamente, Lula sabia disso, pois o sucesso econômico de seu governo deveu-se na verdade pela continuação do programa de estabilidade do governo Fernando Henrique, salvo quando começou a se achar Deus e a derrapar nas curvas da corrupção. E foi a megalomania do governo Lula que incentivou a arrogância de Dilma em acreditar ser possível uma guinada à esquerda, com a adoção equivocada das políticas de Mantega, sem qualquer reforma econômica ou enxugamento da máquina estatal. Pode-se não acreditar na bruxa do mercado, mas que ela existe, existe.

Entretanto, agora o PT é um partido com seu orgulho ferido pelos escândalos da Lava Jato. Incapaz de justificar os 14 bilhões devolvidos ou a serem devolvidos por empresas e infratores, ou de reconhecer seus erros, o que resta ao Partido dos Trabalhadores é radicalizar-se nos seus equívocos, falando para sua militância e para os que desejam acreditar que é possível corrigir injustiças históricas e nossa desigualdade sistêmica – que efetivamente existem e devem ser enfrentadas – com soluções heterodoxas.

A ênfase, portanto, de uma campanha presidencial de sucesso deve ser a recuperação econômica com a estabilização dos fundamentos econômicos, dentre eles o da responsabilidade fiscal. Esse é o campo do candidato centrista, seja ele qual for, pois ambos os candidatos extremistas são incapazes de assumir esse discurso. As políticas sociais são importantes e devem ser resguardadas, mas se deve deixar claro que políticas sociais eficazes somente são possíveis quando o Estado se encontra enxuto, bem financiado e inteligentemente governado. De outro modo, o vale-gás deste mês será engolido pela inflação do próximo.

Os dois candidatos a serem escolhidos no primeiro turno das próximas eleições serão aqueles que souberem apresentar para a população alguma esperança de dias melhores, e nesse ponto Bolsonaro larga em completa desvantagem. Se Lula pode vender falsa esperança amparada no esquecimento dos erros do governo Dilma e na crença de parte da população de que é possível fazer algo apenas pela “decisão política”, Bolsonaro não terá qualquer sucesso em fazer crer que seus quatro anos não foram um desperdício completo.

Certo é que ambos vão disputar a paternidade do Auxílio-Brasil, vendendo-se ao eleitorado mais carente como os novos “pais dos pobres”. Essa disputa, com certeza, será sangrenta e deve ser evitada pelo candidato centrista. É preciso apenas deixar claro que os programas sociais serão devidamente mantidos e até mesmo aperfeiçoados, inclusive pela inclusão social dos milhões de brasileiros invisíveis. Aperfeiçoamentos na área da Saúde e da Assistência Social, especialmente com a adoção de novas tecnologias como a inteligência artificial e a integração de bancos de dados, serão na verdade as melhores soluções de longo prazo para a redução das desigualdades.

A ênfase na recuperação econômica, com a geração de empregos, diminuição inteligente do Estado e manutenção dos programas sociais, é essencial para o sucesso da campanha presidencial da terceira via. Insistir na Educação e na Saúde como elementos equalizadores de nossa desigualdade deverão compor o tripé do programa. O combate à corrupção voltará com certeza à discussão, mas não com a força da eleição passada.

Hoje, o brasileiro quer sobreviver com dignidade e resgatar isso é a missão do próximo governo. Inteligente será aquele que não desconhecer as forças e expectativas do mercado, mas compreender que o Estado não tem razão de existir se não for para garantir que qualquer brasileiro tenha oportunidade de uma vida digna. No final, será sempre essa a mensagem, estúpido!

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