Fabricio Bomjardim/TheNews2/FolhapressO ato de domingo na Paulista: fiasco completo

A encruzilhada da terceira via

Depois do fracasso das manifestações de domingo, os candidatos que tentam se firmar como opção à polarização Lula-Bolsonaro redesenham suas estratégias. Contar com as ruas não parece uma boa opção neste momento
17.09.21

Logo após deixar a manifestação contra o presidente Jair Bolsonaro na Avenida Paulista, na tarde do último domingo, 12, o governador de São Paulo, João Doria, reuniu seu “conselho político” na ala residencial do Palácio dos Bandeirantes. A pauta do encontro era a campanha do tucano nas prévias que vão definir, em novembro, o candidato do PSDB ao Planalto em 2022, mas foi inevitável falar sobre o fiasco do ato promovido naquele dia pelo Movimento Brasil Livre e o Vem Pra Rua, classificado como “anêmico” por um dos participantes da reunião. Doria decidiu ir ao protesto de última hora, depois de ser cobrado pelo WhatsApp pelos organizadores, enquanto as imagens de TV já mostravam um evento completamente esvaziado, bem diferente da manifestação bolsonarista que levara 20 vezes mais pessoas ao mesmo local cinco dias antes, quando o nome do governador foi vaiado pelo público. Os aliados convenceram o tucano de que é preciso ser menos impulsivo e mais estratégico contra um bolsonarismo que tem se mostrado engajado e agressivo tanto nas ruas quanto nas redes sociais. A ficha caiu, e mal – principalmente porque o fiasco do ato, do qual participaram ainda os também presidenciáveis Ciro Gomes, do PDT, e Luiz Henrique Mandetta, do DEM, foi para a conta da chamada terceira via.

Enquanto bolsonaristas e petistas ridicularizaram as manifestações do MBL e do Vem Pra Rua, que foram ainda piores em outras cidades, incluindo Brasília, os entusiastas da construção de uma candidatura de centro para enfrentar a polarização entre Lula e Bolsonaro buscavam respostas para explicar a baixa adesão, apesar do discurso de que aqueles que não querem nem um nem outro são maioria no país – cerca de 55% dos eleitores, segundo as pesquisas. Além da falta de envolvimento das cúpulas partidárias – “foi uma manifestação de CPFs e não de CNPJs”, disse um tucano –, políticos de centro viram o recuo de Bolsonaro dois dias após as ameaças feitas ao Supremo Tribunal Federal no Sete de Setembro como o principal fator desmobilizador das manifestações. “Sem dúvida que a carta do Bolsonaro feita pelo (ex-presidente Michel) Temer desmobilizou”, afirmou um dirigente do PSD de Gilberto Kassab, que tenta emplacar o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, atualmente no DEM, como candidato ao Planalto. Embora a análise predominante na oposição seja a de que Bolsonaro se queimou duplamente no Sete de Setembro – primeiro com parte do empresariado e com aliados de centro que ainda o toleram, e depois com sua militância radical por causa do recuo –, as diferentes fotografias das manifestações de rua levaram os presidenciáveis a recalcular suas rotas.

Reprodução/InstagramReprodução/InstagramDoria decidiu ir de última hora, contra os conselhos de aliados
O governador paulista já acolheu os conselhos de aliados para deixar a “rinha” com Bolsonaro de lado e direcionar seus ataques aos problemas do governo federal, que não são poucos. Além da vacina contra a Covid, grande aposta de dividendo eleitoral que o tucano voltou a explorar na TV com uma nova campanha publicitária martelando a reabertura de São Paulo, o governador passou a divulgar outras iniciativas de sua gestão, como retomada de obras paralisadas e programas de auxílio social para fazer frente ao Bolsa Família, antiga bandeira petista da qual Bolsonaro agora tenta também se aproveitar.

Doria, que para se colocar na disputa presidencial ainda precisa bater o colega gaúcho Eduardo Leite nas prévias tucanas, é uma peça indissociável do dramático tabuleiro da terceira via. Todos os demais pretendentes sabem que, se for ungido como o nome do PSDB, ele não abrirá mão de ser o cabeça de chapa na corrida presidencial, ainda que esteja atrás nas pesquisas em junho do ano que vem, quando ocorrerão as convenções partidárias. Há outros que devem assumir postura exatamente igual. É o caso de Ciro Gomes, que tem elevado os ataques ao ex-presidente Lula, de quem foi ministro, tentando atrair votos dos desiludidos com a corrupção do PT, enquanto se aproxima cada vez mais dos políticos da centro-direita para tentar despontar na raia do meio. O principal flerte de Ciro, hoje, é com Mandetta. Na semana passada, os dois trocaram afagos durante uma live e deixaram no ar a possibilidade de comporem uma mesma chapa.

Rompido com Bolsonaro desde abril do ano passado, quando foi demitido do Ministério da Saúde por divergências quanto à gestão do combate à pandemia, Mandetta era cortejado como vice preferencial tanto por Ciro quanto por Doria, que não acreditavam que o DEM fosse querer gastar um naco considerável do fundo eleitoral numa candidatura presidencial do ex-ministro, estagnado com 4% nas pesquisas. Mas um fato novo em curso na política promete embaralhar ainda mais o cenário dentro da terceira via: a possível fusão do DEM com o PSL em uma legenda de centro-direita que teria 150 milhões de reais apenas de fundo partidário, sem contar os recursos para campanha. Mandetta é um dos principais entusiastas da fusão e admite que o novo partido altera a correlação de forças dentro da terceira via. “A candidatura própria pelo DEM é um fator limitante que deixa de existir com a fusão. É um caminho que está sendo construído e pode ser muito bom para pacificar o país”, disse o ex-ministro. Na próxima terça-feira, 21, a cúpula da sigla comandada por ACM Neto se reúne para discutir o plano e a ideia é que, caso aprovada, a fusão seja formalizada até o fim do ano, para que a nova legenda possa acolher novas filiações e permitir a saída de bolsonaristas como o ministro do Trabalho, Onyx Lorenzoni, na janela de troca-troca partidário no ano que vem.

Adriano Machado/CrusoéAdriano Machado/CrusoéSergio Moro: dúvidas sobre o futuro
A resistência de políticos que disputarão eleições estaduais e cadeiras no Congresso no ano que vem ao uso do fundo eleitoral para financiar uma campanha presidencial é apontada como um dos entraves para a possível candidatura de Rodrigo Pacheco ao Planalto. O nome do presidente do Senado foi lançado por Gilberto Kassab antes mesmo da filiação de Pacheco ao PSD – hoje ele ainda é filiado ao DEM. Para tentar tranquilizar seus aliados, Kassab tem dito que Pacheco financiará sua campanha com recursos próprios e doações de amigos empresários, o que não tem convencido nem correligionários nem adversários. Lideranças de outros partidos acreditam que Kassab lançou o nome de Pacheco para cavar uma vaga de vice de Lula na chapa petista, o que o dono do PSD nega. De qualquer forma, o movimento da dupla Pacheco-Kassab estimulou outros senadores que também ganharam mais notoriedade nos últimos meses com a CPI da Covid, como Alessandro Vieira, do Cidadania, e Simone Tebet, do MDB, a se colocarem no páreo, fragmentando ainda mais a terceira via. Vieira e Tebet estavam ao lado de Ciro, Doria e Mandetta diante das 6 mil pessoas que foram à Avenida Paulista no último domingo.

Nesse tabuleiro complicado ainda há o fator Sergio Moro. O ex-juiz da Lava Jato deve anunciar no mês que vem se pretende se candidatar à Presidência – outra opção é disputar uma vaga no Senado. Convidado a se filiar ao Podemos depois de deixar o Ministério da Justiça do governo Bolsonaro em abril do ano passado, o ex-juiz é quem aparece mais bem colocado nas pesquisas no campo da centro-direita, mas enfrenta rejeição de caciques partidários justamente por causa de sua atuação no combate à corrupção. Nesta semana, Moro convidou Mandetta para uma live com empresários, para discutir o cenário político do país, atolado na polarização entre petistas e bolsonaristas. Com mais perguntas do que respostas até o momento, a terceira via está numa encruzilhada.

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