O distritão dos coronéis
Uma comissão especial da Câmara dos Deputados deve definir nos próximos dias o texto final da reforma política que pode promover a mais profunda mudança no sistema eleitoral brasileiro desde a redemocratização. Uma alteração, em particular, tem merecido a atenção dos deputados. É o projeto que resgata a proposta do chamado distritão para a eleição de deputados federais e estaduais. A ideia é substituir o atual sistema proporcional, em que as cadeiras no Poder Legislativo são distribuídas de acordo com o número de votos obtidos por partidos políticos, por um sistema majoritário, em que os candidatos com o maior número de votos são eleitos, independentemente das siglas a que pertencem, como já ocorre nas eleições para o Senado.
A mudança favorece os oligarcas da política, celebridades e líderes religiosos, cujos nomes são mais facilmente reconhecidos pelos eleitores – obviamente, deputados do Republicanos, partido ligado à Igreja Universal, estão entre os entusiastas do projeto. O distritão, na verdade, é uma maneira nada sutil de garantir a reeleição dos atuais deputados, especialmente dos chefes partidários. “O distritão ajudaria as pessoas que já estão na política a se perpetuar no poder, reduzindo a renovação”, diz a cientista política Mariana Lopes, que preside o movimento de renovação Acredito.
Dirigentes de partidos nanicos também se animam porque o distritão faria sobrar dinheiro em seus caixas. Explica-se: no modelo atual, as siglas precisam apresentar um número alto de candidatos para conseguir votos suficientes para a eleição de seus filiados, distribuindo o dinheiro do fundo eleitoral para muitos candidatos. Com a mudança, elas poderiam concentrar seus esforços apenas nos candidatos “bons de voto”.
Atualmente, a Câmara tem três frentes distintas e simultâneas de trabalho que discutem uma reforma política-eleitoral no país. Mudanças específicas são debatidas desde 1996, quando uma primeira comissão especial foi instalada na Câmara para modificar as regras eleitoras. Mas, desde então, nunca se discutiu um conjunto tão grande de alterações de uma só vez como agora. O risco, como sempre, é o de favorecer os atuais caciques políticos. Ou, para variar, beneficiar a impunidade. Na quinta-feira, 24, sem alarde, a Câmara aprovou um golpe na Lei da Ficha Limpa. O projeto permite que gestores que cometeram atos de improbidade e tenham sido punidos “apenas” com multa sejam eleitos. O projeto ainda precisa da aprovação do Senado para entrar em vigor. Quando o plano é legislar em causa própria, o Congresso funciona às mil maravilhas.
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