Pedro Ladeira/FolhapressO nome de Tasso ganha força, mas Doria resiste a abrir mão da candidatura

A sina tucana

O PSDB participa das tratativas para unir o centro em torno de um candidato único, mas já dá sinais de que quer para si a vaga. Tudo indica que, de novo, penas voarão no ninho tucano
30.04.21

O PSDB, segundo o seu manifesto de fundação, nasceu “longe das benesses oficiais, mas perto do pulsar das ruas”. De lá para cá, o partido mudou de calçada: experimentou o aconchego dos palácios por oito anos com FHC, mas perdeu o pulso das ruas – e faz muito tempo que não o reencontra. As cinco derrotas consecutivas nas eleições presidenciais, sendo a de 2018 a mais acachapante de sua história, são reflexo do divórcio da legenda com o eleitorado. Contribuiu decisivamente para a sequência de infortúnios tucanos a dificuldade do partido em alcançar a unidade interna e em fazer com que orbitassem em torno de si as siglas de centro que num passado não tão distante foram suas aliadas. A sina tucana corre o risco de se repetir em 2022, obedecida a lógica política de seus atuais caciques.  

No discurso, o PSDB diz que até topa fazer parte de uma ampla aliança para se contrapor a Jair Bolsonaro e Lula. No entanto, desde que o candidato a presidente seja alguém do partido. Antes da definição do nome dos tucanos para concorrer em 2022, porém, tudo indica que plumas vão voar no ninho. Mesmo estacionado em um dígito nas pesquisas e com 50% de rejeição, o governador de São Paulo, João Doria, está obstinado em ser presidente, como um dia já estiveram José Serra, Geraldo Alckmin e Aécio Neves — e deu no que deu. Como o partido de 33 anos parece ter saído agora da adolescência e segue sem aprender com as derrotas, as prévias do PSDB prenunciam um cenário não muito alvissareiro para os próprios tucanos.   

Na segunda-feira, 26, a legenda começou a discutir as regras que nortearão a escolha do candidato ao Planalto. A missão quase hercúlea será agradar a todos sem desagradar a ninguém. Nos bastidores, a disputa já esquentou. Convencido de que tem o partido na mão, Doria vai trabalhar pelo voto direto de todos os filiados. Outra ala avalia que devem haver pesos diferentes para os votos, a fim de reduzir a influência do diretório de São Paulo, que abarca 22% dos filiados, a maior fatia do total. Integram esse grupo entusiastas da candidatura de um nome que começou a ganhar musculatura nas últimas semanas, tanto dentro do partido quanto entre outras forças políticas interessadas em lançar um candidato de consenso capaz de quebrar a polarização: o do senador cearense Tasso Jereissati. 

Bruno Santos/FolhapressBruno Santos/FolhapressPara FHC, Tasso é capaz de aglutinar forças políticas para além do PSDB
Tasso é considerado por gente de dentro e de fora do PSDB a pessoa certa no momento certo – e que pode estar no lugar certo se for mesmo o candidato à Presidência em 2022. Exibe perfil de agregador, não tem telhado de vidro, é bom de debate, circula bem entre os partidos de centro e o mais importante, sobretudo quando comparado com Doria: é dono de baixíssima rejeição entre o eleitorado. Seu physique du rôle, que lembra o do presidente americano Joe Biden, logo lhe rendeu a alcunha de “Biden brasileiro”, criada por Diogo Mainardi, sócio-fundador da Crusoé.

O senador, no entanto, adota a cautela ao tratar do assunto. Diz que se seu nome “servir para unir” vai “trabalhar nessa direção”. “Ele tem capacidade de ampliar forças”, afirmou Fernando Henrique Cardoso. Por ora, a família de Tasso vê a possibilidade com reservas. Enxerga uma desgastante campanha no horizonte e prefere vê-lo afastado do que chama de “máquina de moer gente”. O senador, no entanto, tem dado corda na ideia. Autorizou que seu nome seja testado nacionalmente e ampliou as conversas com lideranças políticas durante a semana. Pesquisas devem sair do forno nos próximos dias, mas o primeiro monitoramento nas redes sociais indicou uma boa receptividade entre os eleitores que têm engulhos só de ouvir falar na possibilidade de um segundo turno entre Lula e Bolsonaro.

Tasso sabe, no entanto, que, se começar a se expor muito cedo, pode virar alvo. E não só das falanges bolsonaristas e petistas nas redes sociais. Pode vir chumbo grosso de dentro do próprio PSDB. O histórico do partido é ilustrativo e o cearense está mais do que escaldado. Não é a primeira vez que o senador é cotado para uma candidatura ao Planalto. Em 2002, no cargo de governador do Ceará, ele figurava na lista de possíveis aspirantes a sucessores de FHC, mas foi abatido em pleno voo por José Serra, que virou o candidato oficial e acabou perdendo para Lula. À época, surgiram notícias de que Serra havia encomendado um dossiê contra Tasso. Os documentos nunca vieram à tona, e o alvo na verdade foi outro, mais precisamente outra: Roseana Sarney, do então PFL, aliada que acabou demolida pelo famoso caso Lunus. A especulação foi suficiente para azedar a relação entre os dois. Tanto que o cearense apoiou publicamente um adversário de Serra na corrida eleitoral, o eterno presidenciável Ciro Gomes, e dividiu os tucanos nordestinos. 

Felipe Dalla Valle/Palácio PiratiniFelipe Dalla Valle/Palácio PiratiniCandidato às prévias tucanas, Eduardo Leite cobra “jogo equilibrado”
Agora, mesmo sem fazer movimentos bruscos, Tasso já desperta os instintos primitivos de Doria. O governador de São Paulo não gostou de saber que os tucanos começaram a circular nos grupos de WhatsApp do partido a expressão “PresidenTaSSo” – assim mesmo, com os dois “ésses” que compõem o nome do político ressaltados nas cores verde e amarela. A troça no PSDB é que Doria ficou “PuTaSSo”, ao ver que o possível concorrente admitiu se apresentar para o jogo. Por isso, o governador paulista, que faz da vacinação sua bandeira eleitoral, pretende apostar todas as suas fichas no voto direto das prévias tucanas, modelo que permitiria a votação de 1,4 milhão de filiados, para conseguir sagrar-se vitorioso na disputa interna. Ao contrário de Tasso Jereissati, que defende, além do colégio eleitoral mais restrito, a realização do escrutínio interno somente no próximo ano, Doria quer o pleito já em outubro de 2021. Entende que, dessa forma, não haverá tempo hábil para seus potenciais adversários se fortalecerem.

O problema para o governador de São Paulo é que sua proposta está longe de ser consenso. O ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio, também candidato às prévias, é defensor do adiamento para 2022. Da mesma maneira se posiciona o deputado mineiro Aécio Neves, que ainda exerce certa influência no partido, apesar dos recentes dissabores eleitorais e judiciais — e é adversário figadal de Doria. Já o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, mais um tucano disposto a submeter seu nome ao crivo do partido, fala em conferir peso aos votos conforme o cargo do filiado – as regras precisam ser definidas até o fim de maio. “A prévia deve ter uma estrutura em que tenha um jogo equilibrado. São Paulo naturalmente tem um peso pelo estado que é, pela força que lá o PSDB tem, mas a eleição é nacional”, afirma Leite. Enquanto o clima esquenta na disputa nacional, o governador de São Paulo precisa ficar atento ao próprio ninho: Geraldo Alckmin promete fazer de tudo para ser candidato ao governo estadual, contrariando o desejo de Doria de lançar o vice Rodrigo Garcia, hoje no DEM, mas à beira de assinar a ficha de filiação da legenda. Caso não receba apoio para concorrer ao Palácio dos Bandeirantes, Alckmin ameaça deixar a sigla. Uma das possibilidades é o Podemos. A briga no PSDB está apenas começando.

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