Reprodução/Alladyno ImobiliáriaA mansão de Flávio: ele tem amigos em comum com a família do vendedor

Fazemos qualquer negócio

As estreitas relações da família que vendeu uma mansão para Flávio Bolsonaro com o mundo do poder
12.03.21

Desde que comprou uma mansão por 6 milhões de reais em um condomínio de luxo em Brasília, Flávio Bolsonaro tem dito que não há nada de anormal no negócio, embora ainda não tenha explicado se pagou – ou como pagou – uma parte do valor, exatamente 1,78 milhão de reais, que aparece como quitada na escritura, mas não consta entre as transferências bancárias feitas por ele ao antigo dono do imóvel.

Os envolvidos na transação, revelada na semana passada pelo Antagonista, tentam emplacar a versão de que Flávio e sua mulher chegaram ao empresário Juscelino Sarkis, o proprietário anterior, a partir de um anúncio – e depois seguiram nas tratativas por intermédio de corretores imobiliários. A casa teria sido descoberta pelo casal quase que fortuitamente, portanto. A versão se torna pouco crível à medida que surgem novos personagens que ligam os antigos donos do imóvel ao mundo do poder de Brasília, de maneira geral, e ao clã Bolsonaro e seus satélites, em particular.

Ascom/Sedetec/Governo do SergipeAscom/Sedetec/Governo do SergipeO empresário Juscelino Sarkis: herdeiro de um pequeno império com negócios com o governo
Juscelino Sarkis é herdeiro de uma família que mantém negócios milionários com o governo federal, no ramo imobiliário em especial, e que, literalmente, se relaciona com poderosos desde que Juscelino Kubitschek pisou no Planalto Central para construir o que seria a capital da República, há mais de sessenta anos. O pai de Juscelino Sarkis, Simão Sarkis, foi amigo de Kubitschek – por isso o filho foi batizado com o nome do ex-presidente. Mineiro de Uberlândia, Simão integra o grupo de pioneiros que chegaram a Brasília nos primórdios da cidade, para prestar serviços, e enriqueceram de lá para cá – caso de outros nomes conhecidos, como Nenê Constantino, fundador da companhia aérea Gol.

Hoje, o clã, descendente de libaneses, é dono de um razoável império imobiliário na capital da República. Alguns dos prédios da família abrigam, há anos, repartições do governo. Na última década, só com aluguéis, os Sarkis receberam mais de 40 milhões de reais dos cofres federais. A Funai funciona atualmente em um imóvel da família.

Simão Sarkis e Juscelino Sarkis com JK: proximidade com o poder desde os primórdios de Brasília
Embora tenham um perfil discreto para os padrões da elite brasiliense, os Sarkis mantêm ligações estreitas com políticos de diferentes ordens de grandeza. A história do pai com JK é especialmente interessante. Ele conta que tinha uma pequena empresa de reparos e instalação de refrigeradores no início dos anos 1960 quando recebeu a visita de um militar. Era um ajudante de ordens da Presidência, que estava em busca de um técnico para consertar a geladeira do chefe. Ao chegar ao local do serviço, que outros já tinham tentado fazer sem sucesso, lá estava Juscelino Kubitschek. “Quem veio aqui antes não deu conta, este menino vai dar conta?”, indagou o então presidente. O jovem Simão deu conta. JK gostou tanto dele que o convidou para jantar e, depois, para um passeio. Começou ali uma amizade que duraria até os últimos dias da vida do presidente. Até pouco tempo antes de morrer em um acidente de carro, em 1976, Kubitschek frequentava a casa de Simão Sarkis e os dois costumavam pescar juntos no rio Araguaia.

A família Sarkis nunca mais deixaria de estar próxima do poder, sem que para isso tivesse que assumir preferências políticas – as relações perpassam partidos e ideologias. O rol de amizades inclui deputados, senadores, governadores e outras autoridades relevantes. Os negócios, porém, sempre foram prioridade. No governo de Dilma Rousseff, quando a petista se preparava para disputar a reeleição, o grupo Sarkis, que havia firmado contratos de 18 milhões de reais com o Inep e o Ministério da Cultura, alugou para o PT um prédio que seria usado pela campanha. A transação suscitou questionamentos justamente pelo cruzamento entre os pagamentos oficiais e um contrato firmado com o partido do governo.

A homenagem de Bolsonaro ao patriarca da família e o “elo”, Eduardo Gomes
Com os Bolsonaro, os Sarkis ainda não tinham qualquer proximidade, embora o atual presidente da República circule por Brasília desde o início dos anos 1990, quando se elegeu deputado federal pela primeira vez. A aproximação começou a acontecer mais recentemente. Amigos em comum não faltaram. No ano passado, a família produziu um livro em comemoração aos 80 anos do patriarca Simão Sarkis no qual estampou dezenas de depoimentos de gente importante homenageando o aniversariante. Em uma das páginas do livro, ao qual Crusoé teve acesso, uma surpresa: um depoimento de Jair Bolsonaro. “Meu prezado Simão Sarkis, eu estou aqui, bem acompanhado do nosso amigo Eduardo Gomes, para te mandar um grande abraço e agradecer o apoio e a consideração. Até qualquer dia, se Deus Quiser. Ok, Simão, valeu!”, diz o presidente.

Eduardo Gomes, senador pelo MDB do Tocantins, é o atual líder do governo no Congresso Nacional e um dos parlamentares mais próximos do clã Bolsonaro na atual legislatura. Ex-deputado federal, ele é daqueles políticos escolados no universo de Brasília, com passagens inclusive pelo noticiário sobre o submundo local – seu nome já apareceu até em uma investigação que mirava doleiros brasilienses acostumados a servir a diferentes esquemas de corrupção.

Ainda no início do atual governo, Gomes virou um dos melhores amigos do colega senador Flávio Bolsonaro e tem se encarregado de apresentar o filho 01 do presidente da República às distintas rodas da capital. Com frequência, os dois têm sido vistos juntos em compromissos públicos e privados, incluindo jantares e festas com participação de empresários e integrantes do Poder Judiciário.

Reprodução/InstagramReprodução/InstagramFlávio e Fernanda: versão dá conta de que ela achou a casa em um anúncio
No livro em homenagem ao patriarca da família Sarkis, Eduardo Gomes não disfarça a intimidade: “Não é fácil vencer na vida empresarial, e o grande detalhe que eu tenho a falar sobre Simão Sarkis é que ele conseguiu vencer sem perder a generosidade, a capacidade de ajudar milhares de pessoas que tiveram a sorte de ter contato com ele e foram encaminhadas na vida, quer num custeio de um curso universitário, quer na área da saúde. Então se existe uma pessoa que Deus deu a oportunidade de vencer na vida mas que soube repartir isso com aqueles que mais precisavam, essa pessoa é o Simão Sarkis”.

A Crusoé, Eduardo Gomes afirmou não ter ligação com o negócio firmado entre a família Sarkis, da qual é amigo de longa data, e seu também amigo Flávio Bolsonaro. Juscelino Sarkis não quis falar. Flávio Bolsonaro também não. Entre os compromissos cumpridos nos últimos tempos por Gomes com o 01 a tiracolo estão convescotes em outra mansão, a do governador do Distrito Federal Ibaneis Rocha, também do MDB. Uma advogada do governador ajudou a concretizar o negócio da mansão. É coincidência demais para Flávio e a mulher terem achado a casa em um anúncio.

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