Adriano Machado/CrusoéEunício de Oliveira, o "Índio" dos arquivos da Odebrecht: autopresente no apagar das luzes

O refúgio de Eunício

O presidente do Senado repete que já não tem mais nada a ver com a Confederal, a gigante de segurança enrolada com a Lava Jato com a qual fez fortuna, mas seu apartamento em Miami está registrado em nome da empresa
27.07.18

O presidente do Senado, Eunício Oliveira, gosta de dizer que já não tem mais ligações com a Confederal, a empresa que comandou durante anos e que está no centro de investigações da Lava Jato por ter recebido dinheiro suspeito de empreiteiras. Mas quem o conhece de perto sabe que o vínculo ainda é estreito. Na semana passada, mais uma vez Eunício teve de deixar o Brasil para não ter que assumir a cadeira de presidente da República, com a viagem de Michel Temer — por lei, se assumisse o posto, ele ficaria impedido de se candidatar nas próximas eleições. Sua fuga, como de hábito, foi para Miami. O senador cearense adora a cidade americana. Lá, ele é dono de um confortável apartamento no St. Regis Bal Harbour, um complexo de luxo encravado entre a badalada Collins Avenue e o mar verde-esmeralda da Flórida. A praia contígua ao condomínio, bem mais tranquila que Miami Beach, serve de refúgio para os milionários — Bal Harbour é conhecida como uma das regiões mais exclusivas de Miami. O apartamento de quase 270 metros quadrados foi comprado em 2012, um ano após o complexo ser construído, e hoje seu valor é estimado em nada menos que 3,6 milhões de dólares, ou 13,2 milhões de reais. Detalhe: está em nome da Confederal Vigilância e Transporte de Valores, a empresa da qual Eunício tenta a todo custo se desvincular.

A Confederal é uma pedra no sapato para Eunício. O presidente do Senado é duplamente acusado por delatores, tanto da Odebrecht quanto da Hypermarcas. Ele foi apontado como destinatário de 2 milhões de reais da construtora como contrapartida por atuar no Congresso Nacional para beneficiá-la em medidas provisórias. Nas planilhas do setor de propinas da Odebrecht, Eunício leva o codinome “Índio”. Um dos delatores da empreiteira, o lobista Cláudio Melo Filho, apontou o sobrinho de Eunício como o “operador” destacado para receber propinas em nome dele. Trata-se de Ricardo Lopes Augusto, que vem a ser presidente da Confederal. Segundo o delator, Ricardo era “preposto” do tio e recebeu orientações de onde buscar pagamentos, com detalhes de senha e local.

ReproduçãoReproduçãoA entrada do complexo em Miami, que tem hotel e unidades residenciais: o apartamento de Eunício no resort à beira-mar vale 13 milhões de reais
A Confederal, aliás, já foi alvo de mandados de busca e apreensão na Lava Jato, assim como o próprio sobrinho de Eunício. Aos investigadores, o ex-diretor da Hypermarcas, Nelson Mello, afirmou que pagou 5 milhões de reais ao presidente do Congresso, por meio de contratos de fachada, durante a campanha dele ao governo do Ceará em 2014 — o emedebista acabou derrotado no segundo turno. De novo, a Confederal entra no circuito das investigações. De acordo com o delator, foi por intermédio dela que o dinheiro chegou a Eunício. Apesar do esforço para se desvincular da empresa, o senador fez fortuna como empresário do ramo da segurança, e a Confederal era o seu carro-chefe. O apartamento em Miami é só a cereja do bolo. Desde 2013, a companhia recebeu mais de 160 milhões de reais em contratos firmados apenas com o governo federal.

A Crusoé, primeiro Eunício afirmou que está afastado da Confederal “há muitos anos, desde 1998” e que não é mais acionista. Indagado sobre a razão pela qual o apartamento que utiliza em Miami está no nome da empresa que diz não ser mais sua, o senador rapidamente mudou a resposta. Disse que, na verdade, ainda é acionista. E explicou que a Confederal foi vendida para a Prosegur, mas a transação ainda depende de aval do Cade, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Enquanto isso, não haveria problemas em continuar usando os bens registrados em nome da companhia. “Vendi a empresa, mas não recebi. Se a empresa for embora, o patrimônio que estiver no nome dela vai embora tudo”, declarou, por telefone, a partir da Flórida. Em Brasília, como se vê, não há declaração que não mude ao sabor das evidências.

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