Carlos Fernandodos santos lima

O problema do Brasil

10.07.20

Descoberto o problema do Brasil! Tantos anos de subdesenvolvimento, de uma forma de fazer política baseada em uso de dinheiro ilícito, em rachadinhas, obras superfaturadas e outras formas de corrupção são culpa do mensalão e da Lava Jato. O Brasil idílico de antes dessas operações, aquele Brasil de Collors e Sarneys, Lulas e Lalaus, Aécios, Renans e Jeffersons precisa voltar. Todos unidos contra essas excrescências que tentam criminalizar a política. Sabe quanto custa manter um partido, comprar apoios e disseminar fake news? Destruamos Sergio Moro antes que se torne presidente! Calemos Deltan Dallagnol para que não surjam outros como ele! Acabemos com investigações e tudo se resolverá!

Só que não!

Mesmo sendo isso um completo absurdo, no último mês temos visto uma reação contra a Operação Lava Jato vinda de diversos aliados de ocasião e oportunistas. Essa “Santa Aliança” com o objetivo de denegrir o trabalho investigativo da polícia e do Ministério Público reuniu figuras aparentemente díspares, passando pelos criminalistas de sempre e pelos políticos já bem conhecidos, mas também pelo próprio governo Bolsonaro e pelo procurador-geral da República, Augusto Aras. Cada um por seus motivos inconfessáveis, mas todos irmanados em salvar o status quo.

A esperança desses setores de que as manchetes distorcidas sobre mensagens apócrifas e de origem criminosa, a chamada “Vaza Jato”, pudessem ser o suficiente para manchar a operação não se concretizou. Bem ao contrário, pois, na verdade, poucas autoridades sobreviveriam a revelações de cinco anos de mensagens trocadas como foi o que aconteceu. O que se viu foi que as supostas discussões internas da força-tarefa eram institucionais e buscavam sempre o interesse público em investigar e punir corruptos.

Como as maledicências da “Vaza Jato” não funcionaram, o mecanismo corrupto teve que buscar alternativas para voltar a atacar a operação. A saída de Sergio Moro do governo, expondo a série de atitudes questionáveis do presidente da República, foi a oportunidade de ouro para que essas forças rapidamente se aproximassem.

A partir daí observou-se a realização de uma enxurrada de ataques ordenados, seja por meio do famoso “gabinete do ódio”, instaurado em Brasília e que é alvo de investigação do STF, ou por meio de posicionamentos um tanto quanto questionáveis de autoridades, com um objetivo definido: manchar a imagem da Lava Jato e, consequentemente, abortar qualquer possibilidade da candidatura do ex-juiz para a Presidência. É este o momento em que estamos. Uma união de petistas, bolsonaristas e do Centrão, com todos os apaniguados distribuídos por instituições e órgãos públicos, para reescrever essa história e colocar a culpa nos investigadores, acusadores e juiz.

Este panorama faz entender as recentes polêmicas entre as forças-tarefas da Lava Jato e o gabinete do procurador-geral da República, Augusto Aras, advogado militante que dava pareceres no Ministério Público Federal, uma excrescência do velho Ministério Público subordinado aos interesses do Poder Executivo. O PGR, em desvio de finalidade evidente, promove uma devassa interna na esperança de agradar a Bolsonaro, que o guindou para um cargo tão importante e sensível, com poderes, inclusive, para (não) o investigar.

Evidentemente toda e qualquer instituição ou órgão, de classe ou servidor público, pode e deve ser fiscalizado. E não é diferente com o Ministério Público. Os procuradores da República em sua atividade fim submetem seus pedidos e requerimentos para o Poder Judiciário, enfrentando inúmeros recursos em quatro instâncias de julgamento: o primeiro grau, com o juiz da causa; o segundo grau, com os tribunais de apelação; o STJ em questões de leis federais; e o STF em causas constitucionais. Difícil entender como pode ocorrer abuso com tantas revisões possíveis.

Já na sua atividade meio, ou seja, administrativa, o Ministério Público subordina-se a inúmeros controles, sejam disciplinares, tanto por sua corregedoria interna quanto pela corregedoria do Conselho Nacional do Ministério Público, sejam de prestação de contas, pelos órgãos de controle internos e externos, inclusive o Tribunal de Contas da União. Atacar as forças-tarefas da Lava Jato por questões administrativo-financeiras, como percebemos nas últimas semanas, é completamente inconcebível, uma vez que elas não possuem qualquer autonomia para realizar despesas.

O que se vê, inclusive vindo do próprio gabinete do PGR, com as andanças da subprocuradora Lindôra Araújo por Curitiba, é uma absurda falta de competência, ou simples maledicência, conforme o ponto de vista, pois não só confundiu-se um sistema de gravação de ramais telefônicos internos com um “Guardião” (um aparelho de gerenciamento de quebras telefônicas), como não se sabia que foi a própria administração do MPF que fez a compra, e não a força-tarefa. Se a qualidade das investigações conduzidas pelo PGR for a mesma, é de se temer pelas denúncias apresentadas nesta gestão.

Ao mesmo tempo, num claro movimento coordenado, vemos manifestações pela fiscalização da força-tarefa vindas da Ordem dos Advogados do Brasil, entidade que resiste no Supremo Tribunal Federal em ter suas próprias contas (como outros órgãos de classe) analisadas pelo Tribunal de Contas da União; e de Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados, que não abriu nenhum procedimento ético disciplinar contra qualquer deputado federal envolvido em escândalos.

Todos os interessados nos ataques contra a operação podem distorcer o quanto quiserem a realidade, mas não há como esconder que nós brasileiros pagamos uma taxa chamada corrupção, exigida pela classe política como o preço que temos para sermos “bem governados” por ela, que se imagina uma “aristocracia esclarecida”, quando, na verdade, somos dilapidados por uma oligarquia desqualificada.

E o pior, observa-se ainda que instituições que deveriam ser republicanas são aparelhadas pelas formas de escolha de seus dirigentes, para que o sistema seja perpetuado, mesmo que, eventualmente, uma peça ou outra tenha que ser trocada para satisfazer a necessidade de circo das massas.

A Lava Jato, inclusive, provou isso!

A esperança é que essa clara percepção de como funciona esse “mecanismo” não se contamine com as mentiras da campanha de Bolsonaro, um arrivista que usou das investigações para se promover, sem ter, na verdade, qualquer compromisso com a mudança. O objetivo de todo o rearranjo de forças promovido nos últimos meses, inclusive com a adesão do presidente, é enfraquecer apurações e investigadores para atingir a candidatura de Sergio Moro e impedi-lo de chegar à Presidência. Entretanto, tudo que até agora fizeram foi tornar sua candidatura cada vez mais inevitável e necessária.

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