Adriano Machado/Crusoé

O jogo começa agora

Com o fim da Copa, os partidos e os políticos dão início, oficialmente, à campanha presidencial mais curta e mais imprevisível da história do país
13.07.18

A campanha presidencial deste ano, que começará a pegar fogo de verdade agora, com o fim da Copa do Mundo, tem mais perguntas do que o habitual. Em quem o eleitor órfão de Lula votará? Jair Bolsonaro manterá o patamar de 20% de intenções que o garantem no segundo turno? Geraldo Alckmin decolará? Ciro Gomes morrerá pela boca ou conseguirá agregar os votos da esquerda? Marina Silva, com seu parco tempo de TV, conseguirá manter seus 15%? Os mais de 40% de eleitores que não querem votar em ninguém se manterão no limbo ou devem finalmente optar por algum nome? E qual será ele?

Adriano Machado/CrusoéAdriano Machado/CrusoéJair Bolsonaro: sem Lula, ele lidera as pesquisas, mas ainda tem dificuldades para fechar alianças
A profusão de candidaturas que até há pouco levava a comparações com as eleições de 1989 já começa a dar lugar a acordos e retiradas estratégicas. Para ficar em duas candidaturas, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, do DEM, caminha para oficializar a desistência e o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles, do MDB, ou fará o mesmo ou será solenemente abandonado pelos correligionários. Outros que entraram na pré-corrida também veem seus caciques partidários negociarem, em seus nomes, apoios a outros candidatos. É o caso de Flavio Rocha, do PRB, Manuela D’Ávila, do PCdoB, Afif Domingos, do PSD, e de Aldo Rebelo, do Solidariedade. Fernando Collor, do PTC, já retirou seu nome.

O desenho até aqui mostra que a campanha de 2018 terá características próprias que a distingue de todas as outras. A alta imprevisibilidade é, sem dúvida, a maior delas. “É a marca desta eleição. Quatro pontos ajudam nisso. O primeiro é que a polarização entre PT e PSDB acabou. Há outros partidos no jogo e com chance de vitória. Segundo, há de qualquer forma mais candidatos com chances. Terceiro, a campanha é mais curta. Isso faz com que as estratégias sejam diferentes. Quarto, o eleitor está num nível tal de indignação que seu voto pode ir para qualquer lugar, inclusive nenhum lugar”, afirmou a Crusoé o pesquisador Maurício Moura, da Ideia Big Data.

Adriano Machado/CrusoéAdriano Machado/CrusoéMarina Silva: ela também tem problemas para angariar apoios
O prazo oficial para formação das alianças e para as desistências começa no dia 20 de julho e termina em 5 de agosto. É justamente o período das convenções partidárias. Nele, as legendas definem o caminho a seguir e o desenho que sair daí ajudará a responder parte das perguntas que ainda carecem de resposta. Uma delas é justamente se Jair Bolsonaro, que lidera as pesquisas com a exclusão de Lula, ficha-suja, manterá o atual índice de 20%. Como ele integra um partido nanico, que tem poucos segundos de tempo de TV, a sua principal aposta hoje é atrair o PR do mensaleiro Valdemar Costa Neto. Um arco maior de alianças significa mais tempo de TV e, em consequência, mais espaço para se defender dos ataques. Por estar na dianteira, Bolsonaro é, hoje, o homem a ser batido.

Geraldo Alckmin, por sua vez, sairá no lucro se conseguir manter com ele os quatro partidos que prometeram apoiá-lo: PV, PSD, PTB e PPS. Se atrair também o DEM, o seu tempo de TV será o maior de todos. “Só nossas alianças com esses quatro partidos nos garantem cerca de 20% do tempo de televisão. Até o fim das convenções pretendemos atrair também DEM, PRB, Solidariedade e PROS. A TV é nossa grande aposta”, disse o deputado federal Silvio Torres (SP), tesoureiro do PSDB. Ciro Gomes tem estratégia semelhante, mas seus aliados preferenciais estão mais à esquerda: PSB e PCdoB — sem deixar, porém, os flertes com partidos do centrão e o próprio DEM.

Adriano Machado/CrusoéAdriano Machado/CrusoéCiro Gomes: tentativa de se aproximar do DEM, o antigo PFL que ele sempre criticou
Já para Marina o troféu seria retirar o PPS de Alckmin. A candidata também acredita que as alianças que fez com movimentos políticos desvinculados de partidos, mas com certa inserção na sociedade, devem ajudá-la. Entre esses movimentos está o Agora, do apresentador Luciano Huck. “Conversamos com partidos, mas temos muita expectativa em relação à participação e à influência desses movimentos para levar a Marina ao segundo turno”, diz Bazileu Margarido, um dos coordenadores da campanha. O PT, por ter eleito uma grande bancada em 2014, já tem um bom tempo de TV. Mas tenta ampliá-lo. Alvaro Dias, do nanico Podemos, procura acertar-se com o PRB. O partido ligado à Igreja Universal ampliaria em muito o seu tempo de TV e o seu acesso aos evangélicos.

Outra característica particular das eleições de 2018 será a judicialização da disputa. A começar pelo fato de Lula, preso desde abril, estar legalmente impedido de participar. A queda de braço de decisões acompanhada pelos brasileiros no último domingo foi apenas um aperitivo. Mas o desfecho já está escrito: Lula deverá continuar preso, o PT ainda assim registrará a sua candidatura em 15 de agosto e, depois do já certo indeferimento do registro pelo Tribunal Superior Eleitoral, o partido apresentará um nome alternativo para substituí-lo – os mais cotados são o ex-prefeito paulistano Fernando Haddad e o ex-governador baiano Jaques Wagner. Por ora, a ordem no PT é insistir no nome do ex-presidente. “Lula é nosso candidato até o fim. Há mais de cem políticos presos que foram beneficiados por liminares no STF para levarem adiante suas candidaturas. Esse é nosso plano. O PT não pode entrar em plano B sem antes esgotar todas as hipóteses possíveis para viabilizar Lula”, afirma o deputado estadual José Américo (SP).

Adriano Machado/CrusoéAdriano Machado/CrusoéGeraldo Alckmin: estacionado nas pesquisas
A próxima eleição também deverá ter um recorde de eleitores que não votarão em ninguém. Como Crusoé realçou em reportagem recente, diferentes sondagens apontam que mais de 40% dos entrevistados pretendem se abster de alguma forma. Significa que, hoje, o não voto é, ironicamente, o voto mais convicto que existe entre os eleitores. Para esses brasileiros, nenhum dos candidatos se enquadra nas características que o eleitor busca: alguém conciliador, com ideias claras e imune a escândalos de corrupção. O brasileiro parece estar mais exigente, e entre votar sem convicção e simplesmente não votar, tende a preferir a segunda opção.

Em paralelo, as agendas dos candidatos não empolgam ou assustam. O nacional-desenvolvimentismo do PT e de Ciro significa o naufrágio econômico do país. O liberalismo de Alckmin convence tanto quanto as quedas de Neymar. O de Bolsonaro, autor de projetos nacionalistas na área econômica, é consistente como um pudim. Marina é aquela coisa incorpórea de sempre. Nenhum deles até agora apresentou um programa amplo e suficientemente consistente. O cenário se torna ainda pior com um Congresso que seguirá tão ou mais fragmentado e com o mesmo nível de honestidade do atual, o que fará com que o eleito tenha que negociar freneticamente em mais de um sentido. É o único dado certo em meio a tanta imprevisibilidade.

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