DiogoMainardina ilha do desespero

Bia Kicis palita os dentes

29.05.20

Depois de ver Bia Kicis no YouTube, urrando “Celso de Mello, juiz de merda”, fechei o computador, botei a máscara cirúrgica e corri até a galeria da Accademia, que voltou a abrir nesta semana. Veronese é minha cloroquina: cura qualquer enfermidade, até mesmo aquela causada por Bia Kicis.

Em 1571, Veronese pintou a “Última Ceia” para o refeitório de um convento veneziano, um painel imenso, com mais de treze metros de largura:

Reprodução

A tela rendeu-lhe um processo no Tribunal do Santo Ofício. Em seu interrogatório, o inquisidor acusou-o de ter profanado a imagem sacra com dezenas de figuras mundanas, como o homem que palita os dentes, ou o servo que perde sangue pelo nariz, ou o bufão embriagado. O que fez Veronese? Escamoteou a censura mudando o título do quadro: em vez de representar a Última Ceia, ele passou a representar o Banquete na Casa Levi.

Bia Kicis é igual ao homem que palita os dentes, na tela de Veronese. É um erro cancelar sua figura grotesca com uma pincelada imposta por um tribunal. Ao contrário: ela tem de ser exposta em toda a sua estupidez, nas redes sociais e na imprensa. O fiapo de carne entalado em seu canino tem o efeito de desviar o olhar do espectador daquilo que realmente importa – da tragédia que está para ocorrer. O fato, porém, é que a bestialidade que ela exprime jamais será sufocada, só vai mudar de nome.

Ver Bia Kicis no YouTube, urrando “Celso de Mello, juiz de merda”, despertou em mim os instintos mais opressivos, mas Veronese me curou.

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