MarioSabino

Hoje em dia é pandemia, bebê

22.05.20

Se você quiser ler sobre Jair Bolsonaro, sugiro sair deste artigo imediatamente. Não vou escrever sobre o presidente da República. Estou farto dele. Assim como Lula e seus sequazes, Bolsonaro e seus acólitos roubam o meu tempo. Vou dar uma viajada.

Este artigo é sobre bebês. Os bebês que estão presos na Ucrânia, desde o início da pandemia. Eu não sabia que a Ucrânia é um dos principais fornecedores de barrigas de aluguel do mundo. Uma ucraniana pode ganhar quinze mil dólares para gestar a criança de um casal estrangeiro — um bom dinheiro por lá, até mais que no Brasil. Sai muito mais barato do que nos Estados Unidos, onde uma barriga de aluguel custa até cem mil dólares. A venda de óvulos para mulheres estrangeiras inférteis é outro bom negócio. Pobreza. A empresa ucraniana BioTexcom enfatiza o seu profissionalismo num ambiente depauperado e arriscado:

A certa altura, todo casal quer um bebê, embora às vezes isso não seja possível. Há cerca de 20 anos, adoção era a única solução, mas agora o serviço de barriga de aluguel está ficando mais popular entre casais inférteis. A barriga de aluguel mais barata na Europa está na Ucrânia, o país europeu mais pobre. Não importa se isso envolve numerosos intermediários e vários delitos, assim como qualquer outro negócio na Ucrânia.

A BioTexcom garante mulheres saudáveis, com alimentação balanceada, exames negativos para doenças e jamais residentes na zona de guerra com a Rússia, porque a barriga de aluguel pode pisar numa mina ou ser atingida por bombardeios. No site da empresa, há exemplos de clientes satisfeitos, como um casal brasileiro que afirma não ter conseguido adotar uma criança no Brasil por causa da grande fila de espera. Ficaram ansiosos demais. Talvez a ansiedade fosse menor se levassem a conta a frase de Oscar Wilde: “As crianças começam amando os pais; quando crescem, elas os julgam; às vezes, perdoam-lhes.” Mas isso são outros quinze mil dólares.

A pandemia interrompeu o fluxo do comércio intermediado por catorze empresas ucranianas. Como o país fechou as suas fronteiras para evitar a propagação do coronavírus, os bebês que nasceram de dois meses para cá não puderam ser resgatados pelos casais que pagaram pelo serviço. Segundo o New York Times, uma semana atrás havia sessenta bebês esperando por seus pais biológicos num hotel de Kiev alugado pela BioTexcom para ser berçário. As autoridades estimam que há mais quarenta bebês na mesma situação. E que mil mulheres pagas para serem barrigas de aluguel darão à luz antes que as fronteiras sejam reabertas. Com o surgimento desse problema, ganharam força as vozes que querem proibir o negócio de barrigas de aluguel na Ucrânia, porque o país teria se tornado uma “loja online” de crianças.

A boa notícia é que a BioTexcom oferece desconto de 50% na diária de 54 dólares do berçário improvisado, tudo incluído. Estávamos mesmo precisando de boas notícias neste mundo sem pai nem mãe. Estou farto dele.

Dedico esta coluna a Anna Helena, que aprendeu a morrer.

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