DiogoMainardina ilha do desespero

Quem comanda é o vírus

27.03.20

Matei 7.300 americanos. O triplo de Pearl Harbour. Não dava para matar menos. A tabela interativa publicada por Nicholas Kristof permitia apenas 90 dias de quarentena contra a Covid-19. Movendo a seta para a direita e para a esquerda tentei salvar também o resto da humanidade, mas devo ter cometido algum erro – o dedo escorregou – e acabei matando 35 milhões de pessoas. Perdão.

As tabelas sobre a epidemia de Covid-19, com suas curvas de infectados e de mortos, sugerem que os governantes podem fazer escolhas: quarentena de 15 dias ou de 90 dias, isolamento vertical ou horizontal, testes em massa ou localizados, colapso da saúde ou colapso da economia. Mas não é assim que funciona. Nas epidemias, quem comanda é o vírus – ou a bactéria.

Jair Bolsonaro, por exemplo, planeja liberar o comércio para resgatar a economia e, com isso, tentar salvar seu mandato. Se ele fizer isso, a epidemia vai voltar mais mortal. Ele pensa que está no comando da tabela interativa e que pode alongar ou encurtar a quarentena, calculando suas perdas. A realidade, porém, é outra: é o vírus que vai alongar ou encurtar o mandato dele, independentemente de sua vontade.

A conta da Covid-19, que acompanha a tabela interativa de Nicholas Kristof, é impiedosa. Num período de dois meses, uma pessoa com gripe contamina outras 386 pessoas. Quase nenhuma vai parar no hospital. Um doente com Covid-19 contamina 99 mil pessoas, e aproximadamente 20 mil precisam ser hospitalizadas. Quem desafiar esse vírus vai perder, porque ele é mais forte.

O medo de epidemias é atávico. Está impresso em nosso DNA. Jair Bolsonaro pode fazer seus discursos, mas os brasileiros vão escapar apavorados assim que a TV mostrar o primeiro corredor lotado de hospital, com doentes arfando em seus respiradores. Nossa espécie só sobreviveu por causa disso: ela sabe quando é o caso de lutar e quando é o caso de fugir. Diante do novo coronavírus, é o caso de fugir.

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