Câmara dos Deputados

Proposta para financiar Renda Cidadã é ‘drible’ no teto de gastos, avaliam parlamentares

28.09.20 16:17

Parlamentares, especialistas e ministros do Tribunal de Contas da União, o TCU, não viram com bons olhos os planos desenhados pelo governo federal para bancar o Renda Cidadã, substituto do Bolsa Família. A ideia da gestão Jair Bolsonaro é usar duas fontes para completar o custeio do novo programa social: parte da verba reservada para o pagamento de precatórios e dos recursos previstos para o Fundeb, principal mecanismo de financiamento da educação básica em todo o país.

Na avaliação do grupo crítico aos mecanismos de financiamento escolhidos, apesar do discurso em defesa do teto de gastos, na prática, o governo federal busca driblá-lo. Sem citar nominalmente a proposta da equipe comandada por Paulo Guedes, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, declarou que o Congresso e o governo precisam “enfrentar o desafio de regulamentar o teto de gastos já”. “Essa indefinição pode provocar mais uma crise que vai impactar a vida dos brasileiros, adiando ainda mais a recuperação econômica provocada pela pandemia”, completou.

O ministro Bruno Dantas, do TCU, viu a proposta como uma forma de “mascarar” a mudança do teto. Isso porque o anúncio ocorre pouco mais de um mês após o Congresso promulgar a PEC que torna o Fundeb permanente e amplia a parcela de contribuição da União para o custeio do sistema. Hoje, o aporte é de 10% sobre as contribuições estaduais e municipais. Com base na nova lei, o percentual subirá, de forma gradual, para 23% ao longo dos próximos seis anos, o que representa cerca de 20 bilhões de reais a mais.

“Inflar o Fundeb para, em seguida, dele tirar 5% para financiar outro programa, é rigorosamente o mesmo que inserir mais uma exceção no parágrafo 6º do art. 107 [da Emenda Constitucional 95, que exclui as despesas com o fundo do Teto]. Por que não fazê-lo às claras?”, indagou. O ministro acrescentou que a utilização de recursos dos precatórios também parece “um truque” para esconder a fuga da lei. “Em vez do teto estimular economia de dinheiro, estimulou a criatividade.”

Relatora da PEC do Fundeb na Câmara, a deputada Professora Dorinha Seabra Rezende, do DEM, afirmou que “não há amparo legal” na proposta do governo. A parlamentar lembrou que, à época da discussão do Fundeb, a equipe econômica tentou incluir no texto a previsão de uso de parte do dinheiro para a renda básica e saiu vencido.

“O Congresso deixou claro que não há espaço para essa discussão. Apesar de serem temas complementares, área social é área social; educação é educação. Não enfrentar o teto e usar o Fundeb como válvula de escape é um absurdo”, disse, em conversa com Crusoé. “Acredito que, com a nova repercussão, o governo não vai insistir em colocar isso no papel”, emendou.

A deputada Tabata Amaral, do PDT, afirmou que o governo “precisa ter coragem de enfrentar privilégios e propor uma reforma tributária justa para financiar a renda básica”. “A Renda Cidadã anunciada por Bolsonaro pretende desviar recursos do Novo Fundeb, aprovado no Congresso. Não vamos permitir que se tire dinheiro da educação pública”, disse. 

O economista Felipe Salto, primeiro diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente, avaliou que recorrer ao Fundeb para pagar pelo Renda Cidadã pode representar “bypass” no teto de gastos e entendeu que “limitar pagamento de precatórios é eufemismo para dizer que se empurrará com a barriga um pedaço relevante dessas despesas (obrigatórias)”. “Não se cancelou um centavo de gasto”, criticou.

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