Adriano Machado/Crusoé

Narrativas de Gilmar e Lewandowski contra a Lava Jato em xeque

13.04.21 07:29

O relatório da Polícia Federal que concluiu não ser possível confirmar a autenticidade das mensagens hackeadas da extinta força-tarefa da Lava Jato de Curitiba mina a estratégia dos detratores da operação de usar o material roubado por hackers em investigações contra os procuradores do Paraná ou até como provas para anular condenações.

No documento, o delegado Felipe Leal, chefe do Serviço de Inquéritos da PF em Brasília, afirma que “não se presume”, com base nos laudos feitos pelos peritos federais, a autenticidade e integridade dos diálogos apreendidos pela Operação Spoofing, e que há “indícios de que o invasor agiu com o dolo específico não apenas de obter como também de adulterar os dados”.

O relatório foi feito a pedido do subprocurador da República José Adonis Callou de Araújo Sá, que encaminhou a seguinte pergunta à Polícia Federal: “É possível, tecnicamente, atestar a integridade e a cadeia de custódia do material digital no intervalo entre a obtenção original pelos hackers e a apreensão pela Polícia Federal?”

Na resposta feita com base em um laudo dos peritos da corporação, o delegado afirma que as mensagens hackeadas da força-tarefa liderada por Deltan Dallagnol (foto) “não possuem assinatura digital, resumos criptográficos, carimbos de tempo emitidos por autoridade certificadora ou outro mecanismo que permita identificar a alteração, inclusão ou supressão de informações em relação aos arquivos originalmente armazenados nos servidores do aplicativo Telegram”.

O relatório foi anexado ao habeas corpus impetrado pelos procuradores contra o inquérito aberto pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça, Humberto Martins, para investigá-los por suposta tentativa de intimidação dos ministros da corte, com base em trechos das mensagens hackeadas. O inquérito foi suspenso no fim de março pela ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal, com parecer da Procuradoria-Geral da República contra a investigação.

Em relação com o inquérito do STJ, Felipe Leal afirma no relatório que “a invasão de dispositivo resulta na coleta de dados indelevelmente marcados por um vício de ilegalidade, circunstância que não pode – ou ao menos não se espera – ser superada com flancos de investigação em face das próprias vítimas”. Para ele, “investigação lastreada por provas com prévio conhecimento de sua ilicitude, configura crime de abuso de autoridade”.

No mesmo documento, o delegado da PF vai além, e expõe um argumento que contesta a narrativa apresentada pelos ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, que já fizeram uso informal das mensagens hackeadas durante o julgamento que declarou o ex-juiz Sergio Moro parcial para julgar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em março, na Segunda Turma do Supremo.

Tanto Gilmar, mas principalmente Lewandowski, afirmaram nas sessões de julgamento sobre a parcialidade de Moro que as mensagens tinham sido periciadas pela Polícia Federal, o que afastaria qualquer possibilidade de adulteração dos diálogos pelos hackers. Para o delegado da PF, contudo, “o atesto da cadeia de obtenção da prova da invasão não significa confirmar autenticidade e integridade do teor das conversas obtidas”.

Em outro trecho do relatório, o delegado Felipe Leal explica que a perícia da PF assegurou a integridade do material após a apreensão com o hacker. “Esclarecendo de maneira técnica, não se deve confundir o atesto de autenticidade e integridade de um item digital antes de sua coleta com o atesto de autenticidade e integridade da cadeia de prova relacionada a um item digital entre a sua coleta e o seu armazenamento em mídia anexa a um laudo pericial. São momentos distintos, fazendo-se necessário inserir um dique entre eles para evitar discussões inesgotáveis sobre o tema”, afirma o delegado.

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