Pedro Ladeira/Folhapress

EXCLUSIVO: Bolsonaro pediu a Aras para que Wassef fosse recebido na PGR em reunião para tratar de acordo da JBS

20.08.20 13:34

O presidente Jair Bolsonaro pediu ao procurador-geral da República, Augusto Aras, para que o advogado Frederick Wassef fosse recebido na sede da PGR no fim do ano passado para a reunião em que ele tratou do acordo de delação premiada da JBS.

Como Crusoé revelou nesta quarta-feira, 19, Wassef recebeu 9 milhões de reais da companhia de Joesley e Wesley Batista e fez gestões junto à PGR contra a anulação do acordo de delação, uma medida que pode levar os irmãos de volta para a cadeia.

Bolsonaro não apenas pediu a Augusto Aras para que Frederick Wassef fosse recebido como telefonou, pessoalmente, para o procurador que o receberia para tratar do assunto.

O encontro ocorreu no fim do ano passado. O subprocurador-geral José Adonis Callou de Araújo Sá tinha acabado de ser escolhido por Aras para coordenar o grupo de trabalho da Lava Jato na PGR, que cuida dos processos e inquéritos relacionados à operação.

Pouco antes do encontro, o próprio Aras ligou para Adonis Callou dizendo que o presidente Jair Bolsonaro lhe havia feito um pedido para que Wassef fosse recebido na Procuradoria, para uma conversa com o responsável pelos casos da Lava Jato. Aras queria que Adonis atendesse o advogado, a pedido do presidente da República.

A audiência foi marcada, como queriam o procurador-geral e o presidente. Qual não foi a surpresa quando, horas antes da conversa com Wassef, Adonis Callou recebeu uma ligação do próprio Jair Bolsonaro.

O presidente da República não entrou em detalhes sobre o que seria tratado pelo advogado, mas falou como quem quisesse chancelar o encontro e demonstrar, de alguma forma, seu contentamento com a disposição do procurador em atender Wassef. Mostrou-se agradecido pela atenção e desejou a Callou sucesso na condução do grupo de trabalho da Lava Jato, cuja coordenação ele acabara de assumir.

O procurador se surpreendeu com o telefonema de Bolsonaro. Afinal, não é algo corriqueiro para um subprocurador de chão de fábrica, por assim dizer (ele é tido como um profissional operacional, dedicado e pouco afeito às mesuras da política), receber um chamado do presidente da República, em pessoa.

Àquela altura, embora já tivesse recebido o pedido de Aras para atender Frederick Wassef, Adonis nem sequer sabia que o advogado era também defensor do próprio Jair Bolsonaro. A mistura de interesses que envolvia o presidente, o advogado do presidente e o procurador-geral da República escolhido pelo presidente não estava tão clara, ainda, para o então coordenador da Lava Jato.

Contatos feitos, estava tudo pronto para a reunião com Wassef. O encontro ocorreu no gabinete de Adonis Callou, no edifício-sede da PGR. Como Aras havia antecipado que Wassef gostaria de conversar sobre o acordo de delação premiada da JBS, Callou, recém-chegado à Lava Jato, pediu que uma das procuradoras do grupo de trabalho, Maria Clara Noleto, acompanhasse a conversa.

Como Crusoé revelou, a reunião foi constrangedora. Wassef, sentindo-se à vontade, foi direto ao ponto. Disse que gostaria de apontar a injustiça que seria a anulação do acordo de delação, em suas palavras um dos mais eficazes da Lava Jato até aquele momento.

A conversa acabou quando os procuradores perguntaram a Wassef se ele tinha procuração para tratar dos interesses da JBS. Ele respondeu que não naquele momento, mas disse que poderia apresentar o documento depois. O encontro, então, foi encerrado por iniciativa dos procuradores, conforme relato feito a Crusoé por uma fonte primária.

A PGR, àquela altura, defendia oficialmente a rescisão do acordo, algo que aterroriza os irmãos Batista em razão do risco de eles serem punidos nos processos a que respondem.

A Procuradoria já havia enviado alguns pareceres ao Supremo defendendo a anulação dos benefícios aos delatores. Envolta em polêmicas diversas, especialmente em razão da descoberta de que um dos procuradores que representaram a PGR na negociação vinha atuando também em parceria com um dos escritórios que defendiam a companhia, a delação fechada em 2017 logo passou a ser questionada.

O próprio Rodrigo Janot, responsável por fechar o acordo, chegou a defender sua revogação. A sucessora dele, na PGR, Raquel Dodge, reforçou o pedido junto ao Supremo. Em novembro do ano passado, o próprio Augusto Aras chegou a defender a rescisão em mais um parecer enviado ao Supremo Tribunal Federal. Curiosamente, depois das gestões de Wassef junto ao gabinete do procurador-geral, a PGR passou a considerar a possibilidade de rever sua posição e iniciou, então, tratativas no sentido de repactuar o acordo com a JBS.

O julgamento da anulação da delação no STF, em processo sob a relatoria do ministro Edson Fachin, chegou ser pautado para o último dia 17 de junho, mas acabou adiado. Pouco antes, a PGR reabriu as negociações com a companhia.

Adonis Callou deixou o grupo de trabalho da Lava Jato em janeiro deste ano, por divergências com Augusto Aras – ele alegou falta de autonomia para atuar e apontou, nos bastidores, interferências do gabinete do PGR nos trabalhos da equipe da Lava Jato.

Para o lugar dele, Aras chamou uma subprocuradora-geral de sua absoluta confiança, Lindôra Araújo, a mesma que tempos depois, entraria em colisão frontal com as forças-tarefas da operação. Hoje, é Lindôra quem negocia, junto com Aras, a repactuação da delação.

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