Adriano Machado/Crusoé

‘A nota de R$ 200 é um retrocesso no combate à corrupção’, diz o procurador Júlio Marcelo

30.07.20 15:41

A decisão do Conselho Monetário Nacional que autorizou a criação de uma nota de 200 reais pode facilitar o transporte de dinheiro em espécie e favorecer corruptos. A opinião é do procurador Júlio Marcelo de Oliveira, do Ministério Público de Contas, que critica a ausência de estudos diagnósticos que comprovem a necessidade de uma nova cédula de valor alto.

“A União Europeia tinha nota de 500 euros, que foi retirada de circulação, justamente porque favorecia a corrupção e o transporte de dinheiro em espécie para operações ilícitas e espúrias. Isso também pode acontecer aqui”, argumenta o procurador. Confira abaixo a entrevista com Júlio Marcelo.

Qual é a sua avaliação sobre a decisão do Conselho Monetário Nacional de lançar uma nota de 200 reais?
No campo da corrupção, a existência de notas de maior valor facilita o transporte de dinheiro em espécie. Para quem quer evitar a rastreabilidade do dinheiro e receber de forma oculta, é melhor receber um pacote de notas de 200 reais do que de notas de 100 reais, porque ele tem metade do volume e do peso. É muito mais fácil e discreto de transportar. Em vários países, se discute até o fim do papel moeda. No campo do combate à corrupção, a nova nota de 200 reais é um retrocesso.

Como é a política de outros países com relação a notas de valor alto?
A União Europeia tinha nota de 500 euros, que foi retirada de circulação, justamente porque favorecia a corrupção e o transporte de dinheiro em espécie para operações ilícitas e espúrias.

Uma das justificativas do governo é o aumento da circulação de dinheiro em espécie, por conta do pagamento do auxílio emergencial. Esse argumento é plausível?
Essa justificativa parece forçada. O beneficiário do auxílio emergencial usa notas de menor valor, eles precisam de notas de 10, 20, 50 reais. Até a nota de 100 é inconveniente, porque dificulta o troco em pequenas compras. As grandes notas são um problema para pequenos negócios. Essa não é uma justificativa plausível. Até porque o pagamento do auxílio é uma situação transitória, não vamos ter o benefício daqui a alguns meses. Ou, se tiver algum programa, será em valor menor.

O gasto com a produção das notas de 200 reais poderia ser direcionado então a notas de menor valor?
Com certeza, se tem demanda, seria o caso de aumentar notas de 10, 20 ou 50 reais, em vez de criar uma nota de valor maior. A produção e distribuição dessas cédulas pelo território requer uma grande operação e tem um custo alto, que até seria justificável se a necessidade realmente existisse. Mas o que me parece é que não há essa demanda, até porque que estamos em uma realidade de redução da circulação do papel moeda.

O MP de Contas pode questionar a decisão do CMN que criou a nota de 200 reais?
A decisão pode ser avaliada quanto à questão da existência de um diagnóstico prévio. A gente não pode substituir o gestor em um leque de escolhas possíveis, quando há um problema a ser resolvido. Mas houve estudo? Houve um diagnóstico? Isso está aderente aos fatos? Essas questões poderão ser avaliadas, sim, tanto a necessidade da nova nota, quanto a análise dos inconvenientes, como o problema da corrupção, que certamente o governo tem que levar em consideração em qualquer estudo que se faça sobre isso.

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